Exausto, não vendo mais sentido na vida, Elias adormece debaixo de uma pequena árvore no deserto. Em certo momento, alguém o toca e ele acorda. Quando parece não haver ninguém mais, eis que o mundo não se mostra tão inóspito e abandonado. O texto diz literalmente “e vejam este anjo tocando nele” (1 Reis 19.5). E o anjo lhe diz: “Levanta e come”.
O que vemos aqui não se deixa apreender tão fácil em nossas mentes acostumadas a separar o que Deus une. Para muitos, a aparição de um anjo seria algo extraordinário, talvez motivo para uma reconfiguração do cenário religioso e espiritual. Coisas extraordinárias requeririam uma religião que não só se abra para a percepção do extraordinário, mas que passe a reverenciá-lo da devida forma. Se prestarmos bem atenção, o que temos aqui está longe disso. Um anjo aparecendo para alguém é tão natural, para o texto bíblico, que nem precisa comentário. Mesmo um anjo tocando uma pessoa, é só parte do mundo como Deus o criou. O que encanta aqui é que o anjo não remete a coisas fantásticas. Ele carinhosamente acorda o profeta e lhe alcança comida e água.
Alimentado, Elias deita e dorme de novo. Algum tempo depois o anjo, agora descrito como “o anjo do Senhor” (19.7) o toca novamente e novamente lhe diz para comer. E acrescenta um começo de explicação: “Tens um longo caminho pela frente”. Elias levanta, come e bebe, e com a energia dessa refeição caminha 40 dias e noites sem parar. 40 anos o povo caminhou pelo deserto, alimentado pelo maná divino, o “cereal do céu”, a “comida dos anjos” (Salmos 78.24-25). “Pode, acaso, Deus preparar-nos uma mesa no deserto?”, perguntavam-se incrédulos os israelitas (Salmos 78.19). 40 dias o profeta caminha agora pelo deserto, alimentado da mesa do Senhor.
E Elias chega, finalmente, ao Monte Horebe. O mesmo ao qual os israelitas, guiados por Moisés, chegaram muito tempo atrás. Ali eles presenciaram uma impactante aparição divina (Êxodo 19.16-19). E ali receberam a Instrução que haveria de orientá-los em seus caminhos com Deus daí em diante. O cenário está preparado para que Elias reviva algo dessa experiência dos antepassados. Algum motivo sua longa caminhada pelo deserto até o Horebe há de ter. É o que veremos.
Dia 323 – Ano 1