Os livros de Samuel dão continuidade à narrativa, tanto de Juízes como de Rute. Quanto tempo se passa, é difícil dizer. Mas o cenário aqui está um pouco diferente, por exemplo no fato de agora haver uma espécie de santuário central dos israelitas (em Silo, 1 Samuel 1.3). E é ali que acontecem os primeiros episódios dessa retomada da narrativa.
Tal como Juízes 19, ela começa apresentando um homem “da região montanhosa de Efraim” (1 Samuel 1.1), Elcana, e suas duas mulheres, Ana e Penina. Era um daqueles israelitas piedosos, que cumpria pontualmente seus deveres religiosos. Uma vez ao ano ele peregrinava ao santuário, para “adorar e fazer sacrifícios ao Senhor dos Exércitos” (v.3). Essa é a primeira vez que aparece esse nome de Deus, que a partir de agora será frequente. A palavra tsevá designa “agrupamentos de seres em função de certas tarefas”. A palavra portuguesa “exércitos” veio a se tornar demasiado estreita tanto para denotar o tipo de seres, como o tipo de tarefas.
Ao longo da Bíblia o termo é bastante usado para se referir aos exércitos de Israel. Mas esse uso militar é derivado, específico. E mesmo ele é compreendido na narrativa bíblica de forma bem mais ampla do que quando nós hoje falamos de “exército” como profissionais da guerra. É usado, por exemplo, para as hostes angelicais, das quais só secundariamente se poderia dizer que têm funções militares. O nome “o Senhor dos Exércitos” aponta para um “exército” de conotações muito mais amplas. Isso é mostrado na primeira vez que o termo é usado na Bíblia (Gênesis 2.1): “E concluiu os céus, a terra e todo o seu tsevá”, que aqui significa “todo o conjunto dos seres que neles habitam”.
Uma explicação como essa não seria necessária, se o povo de Deus ao longo de sua história não tivesse tido uma grande inclinação a se tornar “guerreiro”, se baseando, por exemplo, nesse nome de Deus e em histórias bíblicas contextualmente restritas. Nos nossos dias essa visão está se alastrando assustadoramente. Em nome da vida de todos os seres criados por Deus, há que resistir a um uso da Palavra que a militarize em função da vida e dos interesses de uma parte desse conjunto de seres, em detrimento das outras partes. Quanto às “táticas” desse Deus, a Palavra é clara: “Não por força, nem por violência, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor dos Exércitos” (Zacarias 4.6).
Dia 231 – Ano 1