O “povo da terra” coloca no trono o filho do rei assassinado, Josias, de 8 anos de idade, mantendo a casa de Davi no poder em Jerusalém. O fim já foi decretado (“… eliminarei Jerusalém; … Abandonarei o resto da minha herança”, 2 Reis 21.13-14), mas persiste uma pontinha de esperança.
Josias “fez o que era reto diante dos olhos do Senhor” (2 Reis 22.2), “andou em todo o caminho de seu pai Davi”. No ano 18 do seu reinado, enquanto estavam sendo feitas reformas no templo, uma importante descoberta é anunciada. “O sacerdote Hilquias me entregou um livro”, diz o escrivão ao rei. “E o leu diante do rei” (22.10). Por um tempo, essa descoberta teria profundas repercussões na vida e na política no reino de Judá. O sacerdote havia identificado o livro como sêfer ha-torá, o Livro da Instrução. A narrativa o identifica com a Torá, a “Instrução” legada por Deus através de Moisés.
A pergunta crucial é: se esse é o Livro da Instrução, como é que ele estava perdido? O texto sugere que ninguém, a não ser talvez o sacerdote, sequer sabia do livro. De qualquer forma, ele é tratado quase como uma descoberta arqueológica, que ilumina o passado mas não tem qualquer relevância para o presente. “E então, quando o rei ouviu as palavras do livro da Instrução, rasgou suas vestes” (22.11), um gesto de lamento e penitência. Naquele tempo, as vestes identificavam as pessoas, indicando seu lugar numa complexa estrutura social. Rasgar as vestes, portanto, queria também dizer algo como “já não sei mais quem sou”, ou “não sou digno de ser quem sou, de usar as vestes que uso”.
O rei levou a sério o livro que, de tão irrelevante que havia se tornado no dia a dia de Judá, chegou a ser esquecido em algum canto do templo. “Grande é a indignação que se acendeu no Senhor contra nós, porque os nossos pais não ouviram as palavras deste livro, para se portarem conforme tudo que está escrito a nosso respeito” (22.13). O livro fala “a nosso respeito”, reconhece o rei, nós somos o seu tema, incluindo “os nossos pais”.
A primeira providência tomada pelo rei foi “consultar o Senhor” (22.13), para saber que providências tomar. E ele envia uma comitiva à profetisa Hulda, que lhe faz saber a palavra do Deus de Israel para aquele momento, e que confirma e atualiza as palavras do livro da Instrução. Essa ressonância entre a palavra do momento e a palavra do texto é de fundamental importância. O texto prevê duas coisas, que a profetisa confirma. Uma, que o mal anunciado está se abatendo sobre o povo de Deus. E a outra, que se o coração se enternece e se humilha perante Deus ao ouvir as palavras da Instrução, se houver arrependimento e penitência sinceros, o Senhor ouve e se enternece (22.19). E com isso as profecias, se cumprem, como temos visto. Aqui, no caso, o mal não mais é cancelado. É postergado por uma geração (22.20). Nada mais conterá o mal que é resultado do próprio mal que causamos.
Dia 1 – Ano 2