O ser humano ultrapassa o limite que Deus lhe havia colocado, e se percebe “nu” (Gênesis 3.7). Entre 2.25 (“estavam nus”) e 3.7 (“perceberam que estavam nus”) há uma distância que deve ser pensada, se quisermos conhecer a condição humana como a Bíblia a reflete. O texto marca esse distanciamento também por um jogo de palavras. Em 2.25, “nus” é arumim; em 3.7, “nus” é eirumim. Há uma diferença qualitativa entre nudez e nudez. Lá ela é natural como o ar que se respira. Aqui ela é causada. E se apresenta como não-natural, a ponto de os humanos imediatamente a esconderem.
Entre Gênesis 3.6 e 3.7 algo se rasga; e o relato que segue vai mostrando como isso assume proporções trágicas. O ser humano “abre os olhos”. Não que antes ele não enxergasse! Mas agora enxerga tudo diferente. Tudo continua o mesmo, mas tudo é radicalmente diferente. Esta é agora a condição humana, e ela persistirá por toda a narrativa bíblica, até os nossos dias.
O que o restante do capítulo descreve, é como um fosso se abrindo, desde o momento em que o ser humano infringiu a determinação divina. O ser humano, com os “olhos abertos”, não enxerga este fosso, que é espiritual. Só é percebido numa dimensão que para ele agora se perdeu. Para poder enxergá-la, ele terá que “fechar os olhos” e deixar que eles sejam abertos novamente para as realidades espirituais. Este fosso começou a dividir, separar o que estava junto: o ser humano de si próprio (3.7), do seu próximo (3.7,12), de Deus (3.8-10), das outras criaturas (3.15), da natureza (3.17-19).
Dia 11 – Ano 1