As denúncias e os apelos do trecho anterior dão lugar, agora, a um poema de lamentação (Isaías 1.21-26). O brado eihá (1.21) é bem traduzido por “Como…!”, expressando perplexidade e lamento. “Se tornou prostituta a Cidade Fiel!”. Jerusalém se tornou Sodoma e Gomorra. Antes ela era “cheia do Direito, justiça morava nela, mas agora, assassinos”.
A sequência dá detalhes da injustiça que mora agora em Jerusalém, em lugar da justiça. Exemplos são dados de como isso afeta as relações econômicas, comerciais (1.22) e de poder (1.23). “Teus líderes são rebeldes, companheiros de ladrões. Todos amam um suborno e perseguem propinas”. Tão atarefados se encontram nisso, que “não buscam o direito do órfão, a causa da viúva não chega a eles”.
Em vista dessa injustiça a morar no lugar da justiça, o profeta tem uma palavra de Deus para este momento que o Seu povo está vivendo. Com grande solenidade, ele anuncia: “Por isso, o Senhor, o Senhor de todos os seres, o Poderoso de Israel, diz: Ai!” (1.24). Deus pedirá contas dos Seus adversários, dos Seus inimigos, que não são outros que o Seu próprio povo. Mas o julgamento não é a última palavra, e sim função da restauração. “Tornarei teus juízes como eram no começo, teus conselheiros como no princípio” (1.25). E o poema desemboca numa bela palavra de promessa. “Depois disso, te chamarão Cidade da Justiça, Cidade Fiel” (1.26).
Essa volta ao começo deve ser meditada. O poema faz um círculo completo, de uma cidade fiel e de justiça a uma cidade corrompida, que passa pelo julgamento divino que a restaura a sua condição originária. Se olharmos bem, não se trata de um círculo, mas de um movimento em espiral para a frente. A experiência da injustiça e do sofrimento é inserida no processo pedagógico de Deus com Seu povo. O começo ao qual se volta é mais experiente, mais maduro. Deus nos molda na nossa história de vida e através dela.
Uma palavra profética (1.27-28) é acrescentada ao poema, dando conta dos destinos das pessoas e dos grupos, e de suas escolhas. “Sião será redimida pelo Direito, seus convertidos pela justiça” (1.27). Sião aqui representa o povo de Deus no âmbito espiritual. Já quanto aos transgressores e os pecadores, seu destino é a destruição. “Os que deixam o Senhor desaparecem” (1.28). Se afastar da presença do Deus da vida é se auto-condenar ao desaparecimento.
Por fim, o texto acrescenta (1.29-31) alguns comentários a respeito dos transgressores, que parecem ter poder aquisitivo. A referência aos “carvalhos” e aos “jardins” (1.29) pode indicar um prazer estético no luxo e na idolatria, mesmo que conscientemente não chamada como tal. Nos faz lembrar do jardim da casa de Manassés, o mal avaliado rei de Judá. O jardim onde ele quis ser enterrado, de tanto que o apreciava (2 Reis 21.18). Os carvalhos ficarão sem folhas e os jardins sem água. A vida dessas pessoas é como uma estopa que queima da faísca de seus atos (Isaías 1.30-31).
Dia 10 – Ano 2