Uma última “palavra pesada” é dirigida contra Tiro, uma cidade portuária fenícia, que junto com Sidom dominava o comércio marítimo no Mediterrâneo. Tiro, “que coloca coroas” (governos), Tiro, “cujos comerciantes são príncipes, cujos negociantes são os poderosos da terra” (Isaías 23.8). Tiro, o “mercado das nações” (23.3). Uma invasão estrangeira, de assírios ou babilônios, destruiu tanto as cidades como os portos (23.11-14). Quando a notícia se espalha, todo o Mediterrâneo se convulsiona (23.5-6; Egito ao sul, Társis ao norte). “Uivem, navios de Társis!” (23.1; 23.14). Comerciantes e poderosos lamentam a perda de lucros e riquezas.
A perspectiva profética ausculta esses fenômenos em sua profundidade. E ali se vê o que na superfície pode parecer bem diferente. A destruição é causada por Deus, é o Seu desígnio que se realiza (23.8-9). O que causa a indignação divina, e a consequente destruição, é descrito pelo profeta por dois ângulos. No primeiro ele mergulha no coração humano: “para desmascarar a soberba de toda glória humana, para revelar a pequenez de todos os grandes da terra” (23.9).
Quando Isaías (2.11; 2.17) insiste em que “só o Senhor será exaltado” não é porque Deus tivesse ciúmes de Suas criaturas. Bem pelo contrário, a glória e a grandeza delas, bem percebida, enaltece o Criador. “Senhor, Senhor nosso, que magnífico é o Teu nome em toda a terra” (Salmos 8.1). “… que são os humanos, para que deles Te lembres? Os filhos dos humanos, para que os visites? E na verdade os fizeste só um pouco menores do que Deus, de glória e de honra os coroaste!” (Salmos 8.4-5).
Insistir em que só o Criador deve ser exaltado é justamente assegurar que Suas criaturas também o serão. Desmascarar e destruir toda falsa glória, toda falsa grandeza, é justamente para permitir que apareça a verdadeira glória e grandeza dos humanos e de todas as criaturas. O que se mostra sempre de novo é que a glória e a grandeza acumulada por alguns leva ao detrimento dos outros. “E o ser humano é menosprezado, as pessoas são aviltadas” e isso o Criador não pode perdoar (Isaías 2.9).
O segundo ângulo pelo qual o profeta descreve o que causa indignação e destruição é um mergulho no coração da sociedade. De novo o que se vê na profundidade da perspectiva profética é bem diferente do que o que aparece na superfície. O que causa indignação e destruição, para nós talvez seja percebido como o contrário, como causa de admiração, exemplo de sucesso. Uma cidade cuja pujança atrai gente do mundo inteiro. Progresso, riqueza. A perspectiva profética destapa o que está no fundo disso tudo, e lhe dá nome: “prostituição” (23.17). A beleza que enche os olhos resulta de soberba e de ganância, que produzem sempre mais soberba e ganância (23.9).
Dia 41 – Ano 2