Estamos em meio a um momento muito delicado na história do povo de Deus. Parte do povo parece propensa a se alinhar às estratégias políticas e aos discursos da elite de Jerusalém. Esta, antes que confiar nas palavras do profeta Isaías prefere seguir seu próprio caminho, que sem dúvida conseguem fazer convincente aos olhos de muitos. Faz-se das mensagens do profeta um discurso entre outros, e de seus argumentos uma narrativa entre outras. Diferentes visões podem reclamar estarem baseadas em antigas tradições religiosas. Há profetas, sacerdotes, videntes, em cada lado do conflito.
Nessas disputas, o jogo nem sempre é limpo. Quando se tem poder para “por uma palavra condenar uma pessoa”, para “retaliar quem decide contra” (Isaías 29.21), a capacidade de coerção pode tomar o lugar da verdade. Quando se tem poder para de alguma forma ditar a líderes religiosos o que devem ou não dizer (30.10), e para manipular a opinião pública em seu favor, a verdade passa a ser ditada por interesses particulares, mesmo que se argumente que eles representam o melhor para todos. Denunciar isso é parte da missão do profeta. Para Isaías, as manobras da elite de Jerusalém e os discursos que as acompanham, na verdade estão dizendo: “Saiam do caminho! Apartem-se da vereda! Tirem da nossa frente o ‘Santo de Israel’” (30.11).
“Por isso, assim diz o Santo de Israel” (30.12): vocês preferem se basear na opressão e na astúcia, e não percebem que isso é iniquidade e que será para vocês como uma enorme bolha num muro, que o fará cair já, já (30.13). A estrutura toda quebrará como um vaso de cerâmica mal feito, e não servirá para mais nada (30.14). “Assim diz o Senhor, o Senhor, o Santo de Israel: a salvação, para vocês, está em se converter e descansar. A força, em se aquietar e confiar. Mas isso vocês não querem!” (30.15). Se os planos não derem certo, eles já têm planos de fuga. Esses, sim, não darão certo (30.16-17).
O povo de Deus prefere confiar nos seus próprios recursos, ou nos recursos que pensa ter. Voz da experiência, realismo, etc., etc.. Cavalos fortes podem nos livrar, as pieguices de Isaías não. “Converter-se” poderia ser visto como demonstrar fraqueza, admitir erros. E que dizer de “descansar, se aquietar e confiar”? A muralha do dinheiro e do poder parece sólida e firme. Isso porque não vêem a bolha de ar que vai minando a estrutura por dentro, até que ela caia irremediavelmente. São dois Israéis que vemos aqui. Dois povos de Deus. Dois tipos de pensamento e de religião. Dois tipos de visão sobre onde estaria a salvação e a força. A rocha firme que todos buscam, Deus já a providenciou: “Vejam: em Sião está colocada uma pedra. Pedra provada, pedra de estrutura, fundamento sólido. Quem confiar, não terá que fugir” (Isaías 28.16).
Dia 60 – Ano 2