O Senhor “tem um fogo em Sião, um forno em Jerusalém” (Isaías 31.9). Isso é dito no fim de uma fala que trata especificamente da ameaça assíria (31.8-9). Que os assírios se cuidem. Mas a fala no fim da qual isso é dito tem como tema os poderosos de Jerusalém que, secretamente, fizeram um acordo com os egípcios para ver se conseguiam se livrar da ameaça assíria (Isaías 31.1-9). E por isso eles são denunciados pelo profeta (“Ai dos que…”). O fogo que adverte os inimigos, adverte também a eles.
Jerusalém é a cidade onde fica o monte Sião, o monte do Templo. Nesse contexto ela é chamada de Ariel (Lareira de Deus, Isaías 29.1), o que remete ao fogo contínuo que lá era mantido. Em Jerusalém, a capital do reino de Judá, fica também o palácio real. Em Isaías 30.33, no fim de outra fala sobre os assírios, é dito que “de há muito está preparada a fogueira, também ela pronta para o rei”, o rei de Judá. O fogo serve para duas coisas. Para destruir e para purificar. Uma das grandes lições do santuário e do templo é que Deus é um “fogo consumidor” (Isaías 33.14), um Deus santo em cuja presença é consumido tudo que é marcado e contaminado pelo pecado. A destruição é função da purificação. O julgamento divino não visa destruir, mas purificar.
Na sequência de todas essas falas, Isaías 32.1 parece mudar de assunto: “Vejam, para a justiça reinará o rei, para o direito governarão as autoridades”. O rei que se assenta no Sião deve representar o Rei que, dos céus sobre o Sião, governa o universo. A fogueira preparada para o rei tem como objetivo purificá-lo para o adequado exercício do seu mandato. Quem governa no Sião, governa “para a justiça”, “para o direito”. Sabemos que a justiça e o direito são os dois pilares do trono de Deus (Salmos 89.14). Como tal, devem ser também os pilares do trono de quem governa no Sião, representando o governo do Altíssimo. Na verdade, os pilares sobre os quais qualquer governo na terra se mantém e deve se manter.
Isso nos coloca diante de uma realidade complexa. O que fazer quando os governantes preferem imaginar que isso não é assim? Quando a transgressão da justiça e a infração do direito são tão normais que se tornam uma “nova normalidade”? Vem governantes, vão governantes, os fundamentos do universo não mudam por causa deles. Todos terão, a seu tempo, a chance de estar diante do “fogo consumidor”, o “Deus do direito” (Isaías 30.18), o “Justo Juiz” (Salmos 7.11). Nos nossos dias, quando governantes são eleitos pelo povo, a exigência continua a mesma: quem governa, governe para a justiça e para o direito. Abraão sentiu como apropriada a pergunta dirigida a Deus: “Não governará com justiça o Juiz de toda a terra?” (Gênesis 18.25). Tanto mais apropriado é exigirmos o mesmo dos que governam qualquer pedaço da terra.
Dia 63 – Ano 2