A grandeza do Servo de Deus está no serviço. Seria quase desnecessário dizer isso, não fosse o fato de que no discurso religioso “servo de Deus” acabou se tornando um designativo que distingue alguém e o coloca acima de outros. Só quando entendemos que a principal dimensão é a do serviço, é que podemos entender os textos que falam da exaltação do Servo.
“Eu, o Senhor, te chamei em justiça” (Isaías 42.6). “Em justiça” significa que toda a missão do Servo tem a ver com a restauração da justiça no mundo. Para isso Deus o toma pela mão e o protege. A missão do Servo tem a ver com as relações humanas. Ele é o que “traz luz para os povos”. Ele é o mediador de uma “aliança com a humanidade”. E isso significa “abrir os olhos aos cegos, tirar do cárcere os prisioneiros, da detenção os que vivem na escuridão” (42.7). O sentido aqui é primariamente espiritual. Os prisioneiros, os que vivem na escuridão, os cegos, são justamente os que têm necessidade daquele que “traz luz aos povos”. Mas é certo também que essa luz quer levar à libertação de todos que de alguma forma são injustamente presos.
No referencial mais imediato, o Servo é o povo de Deus libertado do cativeiro babilônico. O povo viveu na carne o que significa estar cego, ser prisioneiro e habitar na escuridão. E agora pode dizer: “Foi bom eu ter passado por aflições, porque assim pude aprender as Tuas leis” (Salmos 119.71). A história de Israel depois do exílio mostra que, infelizmente, muitas vezes isso foi interpretado no modo “eu no centro”. As “leis” foram sendo reduzidas a regulações do cotidiano, onde mesmo que pensemos que no centro está o Deus a quem votamos obediência, as coisas giram em torno de nós e da qualidade da nossa obediência.
Só há uma maneira de evitar isso, é o servo se colocar no espelho do Servo. Por isso essas mensagens são tão importantes. O servo descobre sua missão na missão do Servo. E esta tem a ver com o papel do povo de Deus entre os povos do mundo. Israel é redimido para “trazer luz aos povos”. E não num sentido pretensioso e colonialista, mas no contexto de uma “aliança com a humanidade” instaurada pelo próprio Deus. Da primeira vez, Israel falhou nesse propósito, em função do qual ele é o povo escolhido. A libertação do cativeiro e o retorno à terra prometida é uma segunda chance que Deus está dando, na esperança de que Israel cumpra esse propósito.
O Senhor zela pela Seu nome. Sua glória não pode ser dada a outro. Seu louvor não pode ser dado aos ídolos (42.8). Não porque Lhe viessem a faltar. Só dando glória e louvor ao Deus Uno se pode assegurar que glória e louvor não sejam sequestrados e atribuídos indevidamente a quem quer que seja. Assegurar isso, faz parte da missão do Servo. Faz parte da luz que ele traz aos povos, faz parte da aliança de Deus com a humanidade que ele restaura e aprofunda.
Dia 88 – Ano 2