O texto continua alternando perspectivas. Agora estamos diante da instauração de um tribunal. Os povos e nações são convocados a mostrar que estão no caminho certo. Que os deuses, e seus representantes, expliquem o que está se passando, revelem o sentido de tudo que tem passado. Que apresentem suas testemunhas e demonstrem sua inocência (Isaías 43.9). O Servo de Deus é chamado a dar testemunho (43.10), “para que saibam, que confiem em mim, que compreendam que Eu sou Ele, que antes de mim não havia deus e nem poderá haver algum depois de mim”.
O jeito de falar aqui é muito significativo: “Eu sou Ele”. “Ele” é o Deus que todos de alguma maneira reconhecem e esperam. E esse Ele “sou Eu”. Muito tempo depois, Paulo, andando por Atenas, percebeu que entre as muitas estátuas de deuses havia uma dedicada “Ao deus desconhecido”. “Esse que vocês adoram sem conhecê-Lo, é Esse que eu anuncio a vocês” (Atos 17.23). E é Dele que o povo de Deus é chamado a dar testemunho. “Eu, Eu sou o Senhor, não há outro salvador. Eu falei, eu salvei, eu anunciei. Não haja deus estranho entre vocês” (Isaías 43.11-12).
A denúncia contra os deuses que não o são, é dirigida a todos os povos, também ao povo de Deus. A radical concentração no Deus Uno visa superar a fragmentação causada pelos deuses, e as divisões e as guerras que ela causa. É para salvar, não para impor ou subjugar. “Eu sou Ele” (43.13), o Deus que todos esperam e que os salva. E Ele é “o Santo de Israel”, que liberta o Seu povo do cativeiro babilônico (43.14; 43.16-17). Ele “criou Israel” (43.15) para ser Sua testemunha e levar Sua bênção a todos os povos.
“Não fiquem lembrando as coisas passadas. Não fiquem remoendo as coisas que ficaram para trás” (43.18). “Vejam, estou fazendo coisas novas. Já estão brotando. Vocês sabem disso!” (43.19). A cura prometida passa por um processo de estabilização do passado. A narrativa bíblica está cheia de convites à rememoração dos grandes feitos de Deus no passado. Quando aqui é dito ao povo que “não fique lembrando”, que “não fique remoendo”, isso significa que há um jeito de lembrar o passado que é nocivo.
O ponto de virada entre lembrança positiva e lembrança nociva, é ver o passado na perspectiva de Deus e do que Ele fez e faz por nós, é ver o passado na perspectiva das “coisas novas”. Deus perdoou (Isaías 40.2), Deus salva (43.11-12). Perdoa o passado, cura a relação com ele, salva de ficar preso em más lembranças, e levado à depressão e ao desânimo. A linha divisória, na prática pode ser tênue. “Quem encobre suas transgressões, não tem futuro” (Provérbios 28.13). Quem confia em que Deus as cobriu com o manto da Sua graça, tem futuro e recebe de volta o seu passado, como louvor e testemunho.
Dia 92 – Ano 2