“Eu, o Senhor, crio tudo isso” (Isaías 45.7). O povo de Deus está sendo chamado a ver a realidade desde a perspectiva divina. O Deus que criou o universo e a humanidade no começo, é o Deus que continua criando “coisas novas” a cada momento na história desse universo e da humanidade. Isso agora é descrito de um jeito bem plástico, bonito.
“Gotejem, céus, do alto! Que as nuvens façam fluir a justiça! Que a terra se abra e receba! Que gere salvação, e que junto brote a justiça! Eu, o Senhor, crio isso” (Isaías 45.8). Os céus, a dimensão espiritual da terra, são chamados a gotejar justiça sobre a terra. As nuvens são vistas como um contínuo, uma atmosfera, chamada a fazer fluir essa justiça dos céus para a terra. A terra é convocada a se abrir receptivamente, para que a justiça seja nela depositada como uma espécie de sêmen que fecunda um útero.
O fruto dessa união é “salvação”, iésha, de onde provém nomes como Isaías e Jesus. Aqui alguém poderia perguntar: mas então é a terra que produz salvação? Não é Deus? A própria forma da pergunta revela o problema de quem pergunta assim. Nos acostumamos tanto com uma lógica dissociativa, uma lógica em que só uma dessas proposições pode ser verdadeira (e a outra falsa), que também vamos lendo a Bíblia desse jeito. Parece que temos uma imperiosa necessidade de normalizar e de normatizar a realidade do jeito que ela é no nosso presente. E ali, ou a salvação é produzida por Deus, ou pela terra (e qualquer terceira possibilidade é excluída, como somos ensinados). Desde a perspectiva divina, há uma unidade, uma inclusividade, onde nós só vemos confronto e exclusão. Deus gera a salvação, e no processo faz a terra gestá-la e trazê-la à luz.
Biblicamente, “salvação” tem tudo a ver com a “justiça”. O que é gotejado dos céus, que flui através das nuvens e é recebido pela terra fecunda, é a justiça. Quando a terra gera salvação, é justiça que ela está gestando. E para que isso não venha a ser esquecido ou perdido de vista, o texto acrescenta: “e que junto brote a justiça!”. A salvação se expressa na justiça, que dos céus passa a permear a terra.
“O amor e a verdade se abraçam,
A justiça e a paz se beijam.
A verdade brota da terra,
a justiça olha dos céus.
O Senhor dá o bem,
e a nossa terra dá o seu fruto” (Salmos 85.10-12).
Dia 99 – Ano 2