Num contexto de turbulências e de inseguranças, Isaías recebe uma palavra especialmente voltada para o grupo que orbitava ao redor dele. “Ata o Testemunho, sela a Instrução entre os meus discípulos” (Isaías 8.16). O momento era de paciência. “Esperarei pelo Senhor, … aguardarei por Ele” (8.17). Há tempo de agir, há tempo de esperar. São dias em que o próprio Deus “esconde o Seu rosto da Casa de Jacó” (8.17).
Deus esconde o rosto do povo em geral, e Se revela a um pequeno grupo que devia, com paciência, se dedicar à Palavra e esperar por Sua ação no tempo certo. Sentindo-se inseguro, o povo poderia apelar para vias mais concretas e rápidas de receber instrução e ajuda divina. “Consultem os ovôt e os iidonim, que falam estranho e murmuram. Um povo não deveria buscar o seu deus, buscar os mortos para ajudar os vivos?” (8.19). A referência aqui é a pessoas que se comunicam com o além, o que fica evidenciado pelo jeito com que “falam estranho e murmuram”. A concretude impressiona as pessoas que ali buscam ajuda. Facilmente o que ali sucede pode ser interpretado como “sinais e milagres”.
A isso a palavra profética contrapõe o fato de Deus já ter dado “sinais e milagres” (8.18): Isaías (“Ele é a salvação”) e seus filhos Shear Iashuv (“um resto voltará”, 7.3) e Maher Shalal Hash Baz (“depressa ao despojo, rápido ao espólio”, 8.3), cujos nomes simbolizam o agir de Deus naqueles dias. Talvez “milagres” inclua também Emanuel (“Deus conosco”, 7.14), o filho da promessa profetizado por Isaías. Aqui de novo podemos estar diante do tema do pequeno, aparentemente insignificante (um toco de árvore, crianças, um riacho manso e silencioso). A presença de Deus ali é o grande sinal, o verdadeiro milagre.
Mas o povo está desencaminhado, e sob o fascínio daquilo que “no concreto” se mostra impressionante e milagroso. E isso eles encontram nos procedimentos dos ovôt e dos iidonim (os mediadores do contato com os espíritos). A percepção de que as pessoas que morrem continuam espiritualmente vivas, era comum na época. E também que se podia ter acesso a elas. Não é isso que é o problema neste texto. O problema são as razões pelas quais se busca esse contato, e especialmente a forma aparatosa que deixa a impressão de que aí, sim, temos “sinais e milagres”. É provável que o evento todo era associado a Deus (“Um povo não deveria buscar o seu deus?”, 8.19). Mas Deus “escondeu Seu rosto”. O povo está buscando Deus onde Ele não será encontrado. E desprezando a Sua presença ali onde Ele quer ser encontrado. Temos que ter cuidado com transposições superficiais desse texto para os nossos dias. Os fenômenos a que ele se refere podem bem estar ocorrendo entre nós em meios em que ostensivamente é o Deus da Bíblia que é buscado e adorado.
“À Instrução! Ao Testemunho!” (8.20). “Quem não falar de acordo com essa Palavra, não verá o alvorecer”. Com isso o trecho volta ao seu início (8.16), mencionando novamente a Instrução e o Testemunho, e insistindo em que é nessa Palavra que Deus pode ser encontrado pelo Seu povo. Não tanto em palavras impressas em um livro, mas na Palavra divina que permeia e dá sentido a estas palavras impressas.
Dia 23 – Ano 2