O capítulo 4 de Números termina (4.49) mencionando que, no acampamento, cada pessoa tinha a sua parte, a sua tarefa. Cada pessoa tinha uma tarefa específica (avodá) na montagem e desmontagem da tenda da família, e cada uma carregaria (massá) a sua parte. É uma imagem geral para o povo de Deus, que ainda no tempo do Novo Testamento será mantida. Ela transmite bem o espírito que anima os textos bíblicos. Em vez de cada pessoa fazer o que achar melhor, seguindo seus instintos e tendendo a ver os outros como limitadores de sua liberdade, ou até como ameaça – todos trabalhando juntos para o bem comum. Cada pessoa é única e tem a sua parte. E o bem da comunidade depende, em certa medida, dessa parte de cada um.
Números 5 trata de problemas que podem comprometer o equilíbrio geral da comunidade. Primeiro, temos problemas mais permanentes: pessoas com doenças consideradas infecciosas, ou com hemorragias crônicas (v.1-4). Estas tinham que ficar de quarentena num lugar à parte, do lado de fora do acampamento. Depois, temos problemas mais circunstanciais: os “pecados do ser humano” (v.6), que são “um fardo” para Deus. Os pecados têm que ser confessados, e também deve haver uma restituição às pessoas contra quem se pecou (v.7-8). São, portanto, medidas de saúde pública, incluindo saúde mental e espiritual, que aqui são contempladas, dentro do contexto da época.
A parte final do capítulo (5.11-31) é chamada de torá ha-quinôt (“instrução acerca dos ciúmes”, v.29). Descreve detalhadamente um rito praticado quando algum homem tinha suspeita de que sua mulher tivesse tido relações com outro homem. Aqui transparece nitidamente o contexto sócio-cultural do patriarcado, com a assimetria que lhe é característica nas relações entre homem e mulher, e que fica em tensão com outras partes mais igualitárias nos textos bíblicos. No devido tempo, o povo de Deus há de compreender que “em Cristo, não pode haver nem homem nem mulher” (Gálatas 3:28), no sentido de uma subserviência que ameace a igualdade e a unidade.
Dia 120 – Ano 1