Levítico 27

Levítico 27

O último capítulo do Livro de Levítico parece acrescentado mais tarde, depois do fecho representado pelo cap. 26. Pode até ser, mas é importante perceber as razões que podem ter levado a isso. O seu tema são os “votos”. Votos, não no sentido eleitoral, mas no sentido de desejos em relação aos quais se assume compromissos.

Vários tipos de votos são tratados aqui. A palavra hebraica néder não tem em primeiro lugar o sentido subjetivo que às vezes associamos à palavra “voto”, como fazer um voto a Deus para que livre de algum mal, alguma doença. É mais parecido com votos de um tipo mais objetivo e até permanente, como são, por exemplo, os “votos monásticos”. Os votos podem se referir a pessoas (Levítico 27.2-8), pessoas “consagradas” a Deus para sempre ou por algum tempo. Por exemplo, 1 Samuel 1.9-28 conta a história de Ana, que pede a Deus um filho que “votará” a Deus caso seja atendida (o filho será Samuel, importante personagem bíblico). Votos podem se referir a animais (Levítico 27.9-13), a casas (27.14-15), terras (27.16-25). Dízimos (27.30-33) pertencem automaticamente a Deus. Em todo o capítulo há um sistema de avaliação e (possível) resgate cujos detalhes são dados, mas cuja lógica não é bem clara para nós. 

A mensagem de fundo aqui poderia ser que coloquemos o nosso dia a dia, tudo que somos, temos e que nos acontece, em relação com Deus e com Sua presença amorosa e cuidadora. Nossas necessidades, nossos desejos mais profundos, nosso passado, nosso futuro, nossa vida. Tudo “dedicado irremissivelmente ao Senhor” (Levítico 27.29). Assim fazendo, nada perdemos, mas tudo ganhamos.

Levítico 27.34 faz um desfecho que engloba desde Êxodo 20 até aqui: “São estes os mandamentos que o Senhor ordenou a Moisés para os filhos de Israel, no monte Sinai”. Os mandamentos fazem parte do processo pedagógico de Deus com o povo escolhido. Seu objetivo maior não é “colocar sob o jugo da lei” depois de ter libertado do “jugo” do Egito, e sim assegurar e aprofundar a liberdade em nível pessoal e social. 

Dia 115 – Ano 1

Êxodo 20

Êxodo 20

Já vimos como é importante perceber a relação entre os mandamentos e a libertação. Deus tirou Seu povo do Egito, onde ele estava oprimido e escravizado. Para quê? Só para levá-lo para dentro do deserto e colocá-lo sob um novo tipo de opressão e escravidão? Nesse momento da narrativa, quando ouvimos a recitação dos Dez Mandamentos, estas questões querem ser refletidas e meditadas.

A relação do ser humano com a lei sempre tem uma tendência a se tornar legalista. Como consequência, a lei passa a oprimir e escravizar. Mas não precisa ser assim. Ao colocar as leis na continuação do evento da libertação, a narrativa bíblica nos deixa uma mensagem: a lei divina quer continuar e aprofundar o processo de libertação.

O povo havia sido liberto da escravidão sócio-política no Egito. Grande passo. Absolutamente fundamental. Mas não é tudo. O processo iniciado deve continuar. Em duas direções. Primeiro, é preciso assegurar que novas escravidões sócio-políticas não voltem a acontecer. Segundo, há uma escravidão da qual os libertados ainda não estão livres: é a escravidão a si próprios. A escravidão de um ser humano “voltado para o seu próprio umbigo” e fazendo o mundo todo girar em torno dele. Nessa condição, o ser humano pode causar muita destruição ao seu próximo e à natureza, e com isso também a si próprio.

Este ser humano, que, se tiver oportunidade, oprimirá e tentará escravizar os outros para que sirvam às suas ambições. É este ser humano que Deus quer educar, amorosamente, para que aprenda a ser, não o opressor, mas o cuidador do próximo e da natureza. Foi com esse propósito que Deus deu os mandamentos: para preservar a frágil liberdade recém alcançada, para fortalecê-la e aprofundá-la, deixá-la criar raízes fortes e profundas nas pessoas e nas formas de organização social. Os mandamentos querem nos tirar da nossa escravidão a nós próprios, e nos tornar cuidadores do nosso próximo e de sua liberdade.

Dia 73 – Ano 1

Êxodo 15.22 — 16.36

Êxodo 15.22 — 16.36

O trecho anterior terminou em festa. Agora começa a longa travessia do deserto: “Então Moisés fez Israel partir do Mar dos Juncos” (15.22), onde haviam tido aquela maravilhosa experiência do cuidado divino.

Mas o sublime não dura muito. Em três dias (ao longo da Bíblia, “três dias” indica um período crítico) o povo “cai na real”. O que leva à pergunta: o que é real, afinal? A resposta a esta pergunta é cheia de implicações. Aprender a respondê-la desde a perspectiva divina, é um aprendizado difícil, como veremos sempre de novo. No momento o povo está com sede e sem água. Quando finalmente encontram água, ela não é potável (15.22-23). O povo já se agita de novo contra Moisés (v.24). Moisés não sabe a resposta, mas sabe Quem pode tê-la (v.25). 

Êxodo 15.25 é muito significativo para a narrativa. Junta duas coisas que de agora em diante o povo vai ter que aprender a juntar: o livramento divino e o mandamento divino. Aprender a articular corretamente livramento e mandamento, será uma chave das mais importantes para o povo de Deus. Ele precisa aprender que a libertação nos torna responsáveis, nos compromete. E que o mandamento é a sequência da libertação: o mandamento divino quer continuar e aprofundar a libertação.

Também Êxodo 15.26 é muito importante. O mandamento divino se correlaciona com a enfermidade. Quer sarar. Quer curar! 

Depois de solucionar o problema da falta de água (15.27) o capítulo 16 fala de comida. É Deus “preparando uma mesa no deserto” para a Sua querida família. O povo, como conta o Salmo 78 (v.19), duvidava de que Deus pudesse fazer isso. Ao longo deste capítulo 16, impressiona como o povo insiste em não escutar o que Deus diz. Uma vida de dureza tinha deixado marcas profundas, que Deus trabalhará com amor e paciência.

Dia 69 – Ano 1

Êxodo 14

Êxodo 14

O faraó ainda não tinha jogado a toalha. Assim, o próprio Deus prepara um último movimento contra o faraó e seu exército, para que os egípcios reconheçam que Ele é Deus (Êxodo 14.4). Pensando que os israelitas estavam desorientados, e tendo se arrependido de deixá-los ir embora, o faraó e seu exército saem em sua perseguição (14.6-9).

Significativa, aqui, é a reação dos israelitas, ao verem o exército egípcio vindo contra eles. Uma reação que ainda veremos muitas vezes, sempre que algum problema maior aparece. O medo e o clamor a Deus (v.10) são compreensíveis. Mas o jeito como apontam o dedo para Moisés, acusando-o de ser o responsável por essa situação toda (v.11-12) mostra como eles ainda tinham muito a aprender. A libertação da escravidão não havia conseguido livrá-los de uma atitude subserviente, de achar que, pensando melhor a escravidão “até que estava mais ou menos”, porque tinham o que comer. À medida em que se afastam do Egito e enfrentam situações problemáticas, eles tendem a esquecer a dureza do passado e lembrar coisas que agora pareciam boas, lamentando terem sido tirados de lá (como dizem explicitamente a Moisés no v.11). Moisés, por seu lado, mostra que os últimos acontecimentos lhe haviam trazido uma fé mais interiorizada e amadurecida (v.13-14).

A segunda parte do capítulo (14.15-31) contém uma das histórias mais conhecidas do Antigo Testamento. Primeiro, o Anjo que acompanhava os israelitas se coloca, com a nuvem, entre eles e os egípcios, impedindo estes de alcançarem os israelitas (v.19-20). Segundo, um forte vento abre caminho pelo meio da água, dividindo-a e permitindo aos israelitas atravessarem o mar a pé (v.21-22). Terceiro, quando os egípcios foram atrás deles, o vento mudou de direção e eles foram submergidos pelas águas (v.23-29). Os israelitas, então (v.31), depois de tudo isso, passaram a confiar em Deus e em Moisés (no momento, pelo menos!).

Dia 67 – Ano 1